III Forum Pernambucano de Software Livre

Em sua terceira edição, o Fórum Pernambucano mostrou a maturidade do Software Livre no mundo corporativo, com apresentações de diversas histórias de sucesso de empresas que adotaram o GNU/Linux como sua plataforma de servidores, ou incluíram a adoção de software livre em sua estratégia de TI.

Leia abaixo o artigo que foi a base para a minha apresentação no evento.


O avanço do Software Livre no Mundo Corporativo

Cesar Brod

Univates, Centro Universitário
Brod Tecnologia
Rua Avelino Talini, 171 - Lajeado - RS - Brazil

cesar@brod.com.br

Abstract. A growing number of corporations are considering the use of Free, Open Source Software for their IT deployment. Several companies have already adopted free software solutions, or at least are using proprietary solutions atop the GNU/Linux operating
system. This article will explore the reasons for the growing interest for free software in the corporate world and will illustrate some success cases.

Resumo. Cada vez mais as empresas estão considerando em seu planejamento estratégico a adoção
de software livre, de código aberto, em sua base tecnológica. Muitas empresas já adotaram soluções em software livre, ou no mínimo migraram soluções proprietárias para a plataforma operacional GNU/Linux. Este artigo explora as razões do interesse crescente pelo software livre no mundo corporativo e ilustra
alguns casos de sucesso.


1. Introdução

A razão pela qual o mundo corporativo passou
a se interessar por software livre é simples: dinheiro. É enorme o apelo de se ter uma solução sem a necessidade do pagamento de licenças de uso que podem depender do número de usuários, número de processadores, ou número de transações em bases de dados. Os outros benefícios da utilização do software livre - confiabilidade, segurança, flexibilidade -, secundários em um primeiro momento, ganham importância à medida em que a empresa percebe que passa a ter um controle nunca antes imaginado sobre as soluções que utiliza.

Não se deve confundir, porém, "livre" com "grátis". Mesmo que as soluções em software livre não impliquem em pagamento de licenças, existem custos de desenvolvimento,implementação e suporte, como nas soluções com softwares proprietários. Nisto se evidencia outra vantagem da utilização de software livre: empresas de natureza similar possuem problemas similares,
e podem conjuntamente assumir o desenvolvimento de soluções, dividindo seu custo e compartilhando equipes de suporte. Uma terceira vantagem é a escalabilidade, que também se traduz em preservação de investimentos: soluções desenvolvidas em um ambiente pequeno
podem ser levadas a um mainframe sem complicações, uma vez que o GNU/Linux é o mesmo para sistemas embarcados, PDAs, Notebooks, Desktops e Servidores dos mais variados portes.

Prova concreta do interesse do mundo corporativo
pelo software livre é o aumento da oferta deste tipo de sistema por fornecedores tradicionais e de grande porte, como a IBM e a HP.


2. Economia

O software livre começa a ser utilizado na empresa de forma transparente aos usuários. Hoje não há nenhuma razão pela qual serviços de compartilhamento de arquivos, impressão, correio eletrônico, internet e intranet sejam implementados com softwares proprietários.

Estes serviços não implicam em nenhuma modificação
nos sistemas utilizados pelos usuários finais. Esta é normalmente a primeira fase de migração de um ambiente proprietário para software livre, e a economia é proporcional ao número de servidores e à quantidade de usuários. A Cosmoquímica, empresa de São Paulo que é uma das maiores distribuidoras de produtos químicos do país, possui todo o seu ambiente de Intranet e Internet baseado em GNU/Linux. A empresa oferece serviços de acesso à Internet e correio eletrônico a todos os seus funcionários e compartilha recursos como arquivos e impressoras em sua rede.

Em Lajeado, no Rio Grande do Sul, a Fruki, fabricante de refrigerantes, começou a adotar o software livre de
maneira similar à Cosmoquímica. Inicialmente foram instalados os serviços de conexão à Internet e e-Mail em uma máquina rodando o GNU/Linux, que hoje também garante o acesso seguro para o acesso à manutenção de seu ERP. Para os usuários, nada mudou.

Ainda que não seja possível mudar todas as aplicações dos servidores para software livre, já existem muitas soluções proprietárias que ao menos podem rodar no ambiente GNU/Linux. As Lojas Arapuã, por exemplo, utilizam softwares em suas estações clientes que necessitam
obrigatoriamente do Windows, mas puderam implementar em seus servidores GNU/Linux um sistema de distribuição de versões que mantém o software que roda nas estações Windows constantemente atualizado.

A subsidiária brasileira da Peugeot tem seu ERP e sistema de gestão das concessionárias rodando em GNU/Linux, ainda que as máquinas que acessam este sistema rode em Windows. Os bons resultados técnicos e econômicos conseguidos pela empresa fizeram com que a solução
adotada no Brasil esteja sendo considerada para todo o resto do mundo.

Os usuários podem começar a se envolver na adoção do software livre utilizando programas de produtividade - as chamadas suítes "Office" - como editores de textos, planilha de cálculos e softwares de apresentação.

O OpenOffice, hoje em sua versão 1.0, é um substituto à
altura para os sistemas proprietários que se propõem a fazer a mesma coisa, além de ser capaz de trabalhar com documentos nos formatos proprietários mais comuns, como os do MS-Office, da Microsoft. É normal que exista alguma resistência à mudança, por isto é importante deslocar parte da verba que não será gasta com a manutenção de licenças para o treinamento dos usuários. Empresas como o Metrô-SP, a EMATER-RS, a PROCERGS, e instituições de ensino como a UNIVATES, Centro Universitário, adotaram o StarOffice (produto da Sun Microsystems que deu origem ao projeto OpenOffice) como plataforma de produtividade padrão para todos os seus usuários, e hoje estão migrando para o OpenOffice.

Mas de quanto dinheiro, afinal, estamos falando? Considerando valores de lista médios para produtos comerciais populares, o software necessário para um servidor custa cerca de R$ 2.000,00 por máquina (este valor pode subir consideravelmente quando este é um servidor de bases de dados, com licenças cobradas por número de usuários). Para as máquinas dos usuários, o custo mínimo de um sistema operacional proprietário é de R$ 180,00 (custo médio quando o sistema é adquirido junto com o equipamento) e os aplicativos de produtividade custam R$ 700,00 ou mais. Isto significa que uma instalação com apenas um servidor e 20 máquinas para os usuários irá custar pouco menos de R$ 20.000,00. Devemos considerar ainda que softwares proprietários acabam forçando seus usuários a uma atualização tecnológica a cada 18 meses, implicando na aquisição constante de novas licenças.


3. Desenvolvimento e porte de soluções

Em muitos casos, o custo total de propriedade de uma solução proprietária faz com que o porte da solução
para o ambiente GNU/Linux ou o desenvolvimento de uma nova solução em software livre mereça ser considerada. Na UNIVATES, o desenvolvimento do GNUTECA, sistema de gestão de acervo, empréstimo e colaboração para bibliotecas teve um custo estimado de R$ 50.000,00, contra um mínimo de R$ 80.000,00 de uma solução proprietária equivalente.

A PROCERGS economizou centenas de milhares de reais para o Estado do Rio Grande do Sul com o desenvolvimento do Direto-GNU, sistema de correio eletrônico, agenda e catálogo de endereços.

A Fast & Foot, empresa que fornece soluções para redes de alimentação como China in Box, Giraffas, Gendai, TGI Friday's, Brevitá, DeNadai, entre outras, pôde permitir que seus clientes passassem a economizar em licenças quando reescreveu seus sistemas para que rodassem no GNU/Linux.

Ambientes como o FlagShip ou o Harbor permitem que aplicações desenvolvidas em Clipper sejam portadas
com facilidade para o ambiente GNU/Linux. CooperPaz-10, uma cooperativa do sistema de saúde da Prefeitura de São Paulo, contratou os serviços de uma consultoria para migrar os sistemas Clipper utilizados por seus filiados
para a plataforma GNU/Linux. Com isto, um número maior de filiados pode utilizar o sistema sem a necessidade de gastos com licenças.

O Banrisul talvez tenha sido quem foi mais longe no porte de uma solução para o ambiente GNU/Linux, ao adotar o sistema como o padrão para a renovação de toda a sua rede de caixas de auto-atendimento. Como a aplicação escrita para o sistema proprietário anteriormente utilizado havia
sido escrita na linguagem C, o porte foi relativamente fácil. Além da economia, que será da casa de milhões de reais, o Banrisul está extremamente satisfeito com o aumento da disponibilidade e a menor necessidade de manutenção dos caixas automáticos utilizando o GNU/Linux. Hoje o Banrisul já trabalha no porte de aplicações de legado para que rodem no GNU/Linux em seu mainframe IBM.


4. Confiabilidade e Segurança

Todas as empresas que adotaram softwares livres são unânimes em concordar que as plataformas livres são mais confiáveis e seguras que as proprietárias. Quando utilizado em desktop, o software livre é virtualmente imune a vírus, e quando usado em servidores, os sistemas são muito mais resistentes a ataques externos. Isto acontece porque
o código aberto dos sistemas livres é constantemente verificado por muitas pessoas, centenas de milhares, no mundo inteiro. Nenhuma empresa de software proprietário é capaz de contratar a mesma quantidade de pessoas. Com um grande número de olhos, todos os problemas se tornam
evidentes rapidamente, e podem ser resolvidos antes que causem maiores danos.

Grandes portais na Internet como o Google e o Yahoo
estão sempre na mira de crackers, que constantemente buscam furos de segurança para poder atacá-los. Os sistemas do Pentágono, da NASA, do Exército Americano também são muito visados. Todos os seus sistemas que possuem acesso externo têm como base o GNU/Linux.

Empresas que fornecem soluções de conectividade, como a Cyclades, também adotaram o GNU/Linux como sua plataforma operacional padrão.


5. Flexibilidade e Escalabilidade

Código aberto traduz-se diretamente em flexibilidade.
O acesso ao código-fonte das soluções em software livre
permite que elas possam ser modificadas até o ponto em que se adeqüem perfeitamente à necessidade da empresa e dos usuários. Não raro, quando adquirem soluções de software proprietário, as empresas têm que adequar seus procedimentos à solução adquirida. Com software livre, é a solução que se adaptará à realidade da empresa, e não o contrário. O SAGU, Sistema Aberto de Gestão Unificada, desenvolvido pela UNIVATES, pode ser adaptado
às necessidades da FABAVI (Faculdades Batistas de Vitória) e da UERGS (Universidade Estadual do Rio Grande do Sul), duas instituições de ensino de natureza bastante diversa.

O código aberto permite também a flexibilidade na escolha de fornecedores. A empresa pode sentir-se mais segura adquirindo uma solução cujo código pode estar disponível a qualquer fornecedor de serviços com conhecimento técnico suficiente para analisar o código, mesmo que a empresa que o forneceu originalmente venha a passar por problemas e deixar de existir.

Por fim, há a flexibilidade na escolha da plataforma de hardware, uma vez que uma solução desenvolvida em GNU/Linux pode rodar em praticamente qualquer tipo de hardware. Isto facilita também a expansão de capacidade - escalabilidade - do ambiente. Uma empresa que tenha um sucesso estrondoso e cresça vertiginosamente pode migrar seu sistema de uma rede de servidores Intel para um mainframe IBM sem maiores problemas.

O GNU/Linux permite que se aumente a capacidade de processamento agregando múltiplos servidores discretos em uma arquitetura de rede, formando clusters que se comportam, no aspecto administrativo, como uma máquina única. Isto pode ser feito com arquiteturas de software como o Beowulf, que permite criar ambientes de alta capacidade de processamento e alta disponibilidade.


6. O envolvimento dos fornecedores

Quando o responsável pela tecnologia de informação de uma empresa tem que tomar uma decisão sobre a plataforma tecnológica a adotar, ele procura estar seguro
quanto a oferta de soluções disponíveis por múltiplos
fornecedores, especialmente os de grande porte. É comum que tecnologias muito novas, de ponta, sejam introduzidas por pequenos fornecedores e inicialmente adotadas por empresas também pequenas e ousadas na tomada de decisões.

Estes pequenos fornecedores e empresas que adotam prematuramente uma tecnologia podem ganhar um grande espaço competitivo caso a nova tecnologia se comprove, ou simplesmente deixarem de existir caso a tendência lançada
não seja seguida. Quando uma grande empresa, porém, abraça uma tecnologia, é porque a mesma já é comprovada e existe um bom mercado para ela. IBM, Sun e HP são algumas das empresas que incluíram a oferta de produtos e serviços em software livre e código aberto em seus portfólios.

7. Conclusão

Antes de adotar qualquer tecnologia, uma empresa
deve fazer uma boa avaliação de seus problemas para definir a solução que realmente precisa. Cada vez mais, como este artigo procurou mostrar, as soluções em software livre são melhores que aquelas oferecidas em software proprietário. Além das razões expostas acima, há outras que são importantes, mesmo que seus benefícios não reflitam de imediato na empresa, mas que trazem
impactos positivos para a sociedade e a soberania nacional:

  • O dinheiro investido na implantação de uma solução em software livre fica no país, não é remetido para o exterior na forma de royalties, pagamento de licenças ou propriedade intelectual;
  • O conhecimento adquirido na construção da solução passa a ser compartilhado, permitindo um domínio cada vez maior da tecnologia e o acesso a ela por uma camada maior da população.


8. Referências

CHASSEL, Robert. Liberdade em Software:
Direitos, Deveres, Metáfora e Ganhando a Vida.



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